quarta-feira, 31 de agosto de 2022

DVORÁK (Sinfonia n.º 9 - "Do Novo Mundo") - 4.º Movimento ("Allegro con fuoco")

Antonín Dvorák (1841-1904)
Compositor checo
Ver mais aqui


4.º Movimento (Extracto)
Orquestra Filarmónica de Berlim
(Maestro: Claudio Abbado)


domingo, 28 de agosto de 2022

Brasil Antigo - Como os portugueses aprenderam a "beber fumo" com os índios...

 



Uma das plantas que mais chamaram a atenção dos portugueses, recém-chegados ao Brasil, foi aquela que denominaram erva-santa, também conhecida por fumo, pétum e petigma.
Era o tabaco.

Alguns jesuítas, como o padre Fernão Cardim (1549-1625), deixaram notas interessantes sobre o novo e estranho vegetal. Referiram, com espanto, o hábito de "beber fumo" que os índios gostosamente patenteavam a partir da combustão das suas folhas.

Diz, entre outras coisas, Cardim:
Costumam estes gentios beber fumo de petigma, ou erva-santa.

Esclarecia que os índios secavam a planta e que a introduziam num canudo feito de folha de palma:

e pondo-lhe o fogo numa ponta metem a outra na boca, e assim estão chupando e bebendo aquele fumo, e o têm por grande mimo e regalo; e deitados em suas redes gastam em tomar estas fumaças parte dos dias e das noites.
A alguns faz muito mal, e os atordoa e embebeda; a outros faz bem e lhes faz deitar muitas reimas [catarro; expectoração] pela boca.




O hábito de "beber fumo" viria posteriormente a ser criticado por alguns padres. Todavia, naquela altura, os eventuais malefícios da planta eram fartamente compensados pelos benefícios que ela, alegadamente, proporcionava.

Acrescenta ainda Cardim sobre o fumo:

As mulheres também o bebem, mas são as velhas e enfermas, porque ele é muito medicinal, principalmente para os doentes de asma, cabeça ou estômago.

Não tardou muito até que os portugueses seguissem, nisto como noutras coisas, o exemplo dos índios:

e daqui - informa Cardim com um laivo de censura  - vem grande parte de os portugueses beberem este fumo, e o têm por vício, ou por preguiça, e imitando os índios gastam nisso dias e noites.

Muitos dos primeiros colonizadores do Brasil tornaram-se fumadores inveterados.
Um dos mais famosos foi o donatário da capitania sulista do Espírito Santo, o infeliz Vasco Fernandes Coutinho, fidalgo português que acabou, pobre e desvalido, a sua aventura brasileira, envolto nas fumaças esbranquiçadas e melancólicas do vício recém-adquirido...


Bibliografia:
Fernão Cardim - Tratados da Terra e Gente do Brasil.

quinta-feira, 25 de agosto de 2022

Suspeitas de crime na morte de D. João VI (de Portugal e Brasil)

Rei D. João VI (Queluz 1767- Lisboa 1826)

Sua Majestade fora a Belém [Lisboa] comer uma merenda. Era nos primeiros dias de Março [de 1826]. Quando voltou a palácio achou-se, à noite, mal – cãibras, sintomas de epilepsia. Vieram médicos: o barão de Alvaiázere e o valido cirurgião Aguiar.

No dia seguinte, o estado do enfermo piorou. E o rei decidiu-se a despir de si o pesado encargo do governo.

A 7, a Gazeta publicava o decreto nomeando a regência, presidida pela infanta D. Isabel Maria, cuja bondade merecia as graças particulares do infeliz pai. Esta minha imperial e real determinação, afirmava o decreto do dia 6, regulará também para o caso em que Deus seja servido chamar-me à sua santa glória, enquanto o legítimo herdeiro e sucessor desta coroa não der as suas providências…

Mas quem era esse legítimo herdeiro?
D. Pedro, o brasileiro?

D. Miguel, no seu desterro de Viena?

Não o dizia o rei moribundo, que toda a vida se achara indeciso, e acabava como tinha existido, sem uma afirmação de vontade, entre flatos, na impotência de uma morte oportuna.


D. João VI no Brasil (ano de 1808)


Em Lisboa corriam os boatos mais extravagantes.

O velho imperador sem império, rei de dois mundos já reduzidos ao que ele chamava o seu canapé da Europa, massa humana estendida num leito, era como um valo ou barreira que represava a torrente de ambições e fúrias soltas ou mal contidas em 1820, em 1823, em 1824.

O caos de conflitos dinásticos, religiosos, políticos, que a fome universal acirrara, ia reaparecer à luz do dia — tão depressa o caixão do imperador-rei terminasse a viagem mortuária, do paço ao carneiro de S. Vicente de Fora.

Logo que a notícia da doença se propagou, e, mais ainda, quando apareceu o decreto do dia 6, correu uma opinião forte. D. João VI tinha sido envenenado.
A peçonha fora propinada nas laranjas da merenda de Belém; embora o dessem por vivo, era cadáver quando saiu o decreto. 

Conservavam-no para enganar, para preparar melhor os ânimos. Mas quem era o autor de tamanhos crimes?

A rainha [Carlota Joaquina], diziam os constitucionais de então.

Os constitucionais, diziam os absolutistas apostólicos.

Entretanto a rainha era esbulhada da regência, e, se tramara o feito, saía-se duas vezes mal — por isto, e porque à indecisão do decreto responderam o consenso geral e os regentes proclamando rei de Portugal o brasileiro [D. Pedro, primeiro imperador do Brasil].


D. João VI regressa do Brasil a Portugal (Lisboa, ano de 1821)


No dia 10 pela tarde morreu o rei, oficial ou realmente. Houve  sentimento e lágrimas, porque, na sua moleza insípida, era bom; sobretudo porque deixava depois de si um vácuo, uma sombra povoada de medos das inevitáveis catástrofes amontoadas e  iminentes.

Este susto agravava a maledicência geral. Ninguém já punha em dúvida a causa da morte do rei. Os boatos eram positivas certezas — de que o parecer dos médicos depois da autópsia concluiria pelo envenenamento.

Em tudo se achavam provas. Os absolutistas afirmavam cerradamente que o cozinheiro Caetano fora convidado pelos constitucionais, e que, por se recusar, morrera com o veneno destinado para o rei: com efeito, o cozinheiro caíra de repente.

Por outro lado, atribuíam-se confissões graves ao barão de Alvaiázere, que também morrera logo; e o cirurgião Aguiar, sobre quem recaíam as acusações de ter propinado o veneno dos pedreiros-livres, o cirurgião valido que fora brindado com um posto na diplomacia, morria também, assassinado segundo uns, suicida na opinião dos mais — devorado pelos remorsos do crime praticado contra o seu benfeitor!

Muita gente dizia ter lido cartas em que de Lisboa se anunciava a doença, a morte certa do rei, bastantes dias antes da merenda de Belém.


Alegoria às virtudes de D. João VI (quadro de Domingos Sequeira)


Se D. João VI morreu ou não envenenado, nem se sabe, nem importa. O que vale é o facto da opinião geral sobre o caso; e essa opinião acreditava num crime.

Os vómitos e delíquios do imperador-rei, o cortejo dos cadáveres com que o seu corpo era metido no túmulo, faziam de um crime o intróito da história dos longos crimes da sua sucessão.

A tragédia portuguesa começava, e o travo da peçonha acirrava os ânimos prontos para um combate inevitável.

A regência, e todos, tinham reconhecido como rei D. Pedro IV [Pedro I do Brasil]; mas com a certeza de que esse acto era uma pura formalidade, um incidente sem alcance, um preito, apenas, dado à doutrina da hereditariedade e ao direito da primogenitura.

Imperador no Brasil, D. Pedro não podia ser rei em Portugal: havia apenas um ano que se assinara o tratado da separação redigido pelo inglês Stuart, e sabia-se que por coisa alguma a Inglaterra consentiria na reunião dos dois estados [Portugal e Brasil].

D. Pedro teria de abdicar por força; e em quem, se não no infante D. Miguel, seu irmão? (…)

Tudo se faria em boa paz, e os medos gerais provar-se-iam infundados.

Ingénua ilusão!

Para além das questões formais, havia, no fundo, um duelo inevitável. (..) Só [seriam de esperar] o ferro, o fogo, o canhão, o punhal, a miséria, e um cataclismo final que terminasse pela morte de um dos contendores. (*)


(*) - Oliveira Martins - Portugal Contemporâneo - Tomo I - 3.ª edição - Pgs.1-5 - Livraria de António Maria Pereira (Editor) - Rua Augusta, 50-54, Lisboa (Ano de 1895)

[Texto actualizado pela Torre da História Ibérica]

segunda-feira, 22 de agosto de 2022

Blues (com Blind Willie McTell e Fred McDowell)



Blind Willie McTell, compositor e intérprete de country blues, nasceu na Geórgia, Estados Unidos, no ano de 1901, tendo falecido em 1959.

Nasceu cego de um olho, tendo perdido totalmente a visão no final da infância.

Canta You Was Born To Die:


 

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Fred McDowell  (ou Mississippi Fred McDowell) nasceu e faleceu no Tennessee, Estados Unidos (1906-1972).

Canta Good Morning Little School Girl:


 
Para saber mais sobre blues, clique aqui.

sábado, 20 de agosto de 2022

Donald Trump é a maior esperança de Vladimir Putin (e Marine Le Pen pode dar uma ajuda)... [Дональд Трамп — главная надежда Владимира Путина (и Марин Ле Пен может помочь)…]

 



Putin, o genocida da Rússia, que continua a mandar praticar crimes de guerra na Ucrânia, sabe que a sua política de expansão imperialista só pode triunfar se os Estados Unidos da América forem derrotados.

Putin pretende enfraquecer e isolar a América. Para isso, quer destruir as democracias europeias (conta aqui com os extremistas de esquerda ou de direita, como Marine Le Pen) e a sua aliança com os Estados Unidos.

.....

Путин, который продолжает отдавать приказы о военных преступлениях на Украине, знает, что его политика империалистической экспансии может быть успешной только в том случае, если Соединенные Штаты Америки потерпят поражение. 

Путин намерен ослабить и изолировать Америку. Для этого он хочет разрушить европейские демократии (включая левых и правых экстремистов, таких как Марин Ле Пен) и их союз с США.

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Por isso lhe convém devolver o poder ao demagogo Trump, o homem que, durante o seu mandato, hostilizou a sua principal aliada (a Europa democrática) e quase destruiu a NATO.

Trump é uma ameaça à democracia americana e à paz no Mundo.

Ele mentiu e continua a mentir descaradamente ao povo. Fala de fraude nas últimas eleições presidenciais, mas provou-se que só ele tentou obter votos fraudulentos (telefonou às autoridades de alguns Estados pedindo-lhes que lhe "arranjassem" votos).

.....

Именно поэтому он хочет вернуть власть демагогу Трампу, человеку, который за время своего пребывания в должности настроил против себя своего главного союзника (демократическую Европу) и чуть не уничтожил НАТО.

Трамп представляет угрозу американской демократии и миру во всем мире.

Он лгал и продолжает нагло лгать народу. Он говорит о фальсификациях на последних президентских выборах, но доказано, что он пытался получить фальшивые голоса (он звонил властям некоторых штатов с просьбой «добыть» для него голоса).

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Além disso, Trump incitou os seus seguidores a invadirem o Capitólio.

É de um presidente como ele que Vladimir Putin necessita na Casa Branca.

A Justiça americana vai render-se a este homem perigoso?

Ele é o indivíduo que James Comey, ex-Director do FBI, comparou com um chefe da MÁFIA... (ver aqui)

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Кроме того, Трамп призвал своих сторонников штурмовать Капитолий.

Именно такой президент нужен Владимиру Путину в Белом доме.

Сдастся ли американское правосудие перед этим опасным человеком?

Джеймс Коми, бывший директор ФБР, сравнил его с боссом МАФИИ... (глянь сюда ---> aqui)



quinta-feira, 18 de agosto de 2022

Balada de Coimbra (Carlos Paredes - Portugal)

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Ó Coimbra do Mondego
E dos amores que lá tive…


A magia desta magnífica cidade portuguesa
de estudantes, de tricanas e de saudades
encerra-se toda na balada
que a genialidade de Carlos Paredes eternizou…

Na antiquíssima e famosa Universidade de Coimbra
fizeram os seus estudos superiores muitos dos homens
que viriam  a participar de modo decisivo
no processo de independência do Brasil (1822).

Um deles foi o célebre José Bonifácio...

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Saiba mais sobre Coimbra - aqui




quarta-feira, 17 de agosto de 2022

segunda-feira, 15 de agosto de 2022

Tesouros do Jazz Antigo (Old Jazz Treasures)

 



1 - Panama
(Johnny Miller - New Orleans Frolickers)


2 - Woo - Woo
(Albert Ammons)



3 - Just the Same
(Roger Wolfe Kahn and His Orchestra)


4 - Crazy Quilt
(Dixon's Jazz Maniacs)



5 - Kater St. Rag
(Bennie Moten's Kansas City Orchestra)



sábado, 13 de agosto de 2022

Uma Burla Fantástica: Os "Diários Secretos de Hitler"

 

À direita: capa da revista Stern, de 25 de Abril de 1983,
com a manchete explosiva: "Descobertos os Diários de Hitler"


Gerd Heidemann, nascido em 1931, foi um repórter da revista alemã Stern, para a qual trabalhou durante mais de 30 anos. Uma das suas ocupações favoritas consistia no estudo afincado do regime nazi, que dominou a Alemanha de 1933 a 1945.

Na década de 1970, Heidemann vendeu uma casa que possuía em Hamburgo e, com o dinheiro recebido, adquiriu um iate, o Carin II, outrora pertencente a Hermann Göering, poderoso número 2 de Adolf Hitler.

Por essa altura conheceu Edda, a filha de Göering, e com ela iniciou uma relação sentimental que duraria cinco anos. O casal organizou no Carin II alguns eventos sociais, aos quais compareciam, entre outras figuras, algumas testemunhas oculares de importantes episódios do III Reich. Os generais da SS Karl Wolff e Wilhelm Mohnke, por exemplo, estiveram entre os convidados. Mohnke, recorde-se, participou na derradeira defesa de Berlim, tendo comandado a resistência nas imediações do "bunker" de Hitler quando o Exército Russo já apertava o cerco final.

Gerd Heidemann com o seu iate "Carin II"

Foi através de um dos antigos oficiais nazis que Heidemann conheceu, nos começos de 1981, Konrad Kujau, nascido em 1938, exótica personagem que ganhava a vida vendendo recordações do III Reich numa loja de Estugarda.

Um dia, Kujau contou ao repórter da Stern uma estranha e surpreendente história. Um seu irmão, oficial do Exército da Alemanha Oriental, tivera acesso aos diários manuscritos de Adolfo Hitler e conseguira fazê-los passar para a Alemanha Ocidental. Agora, pretendia vendê-los por bom preço, tendo Kujau como intermediário.

Konrad Kujau e um dos 62 volumes

Nunca antes se ouvira falar de tais diários. Mas Kujau forneceu uma explicação. Nos derradeiros dias de Abril de 1945, pouco antes do suicídio do ditador alemão (ocorrido a 30 desse mês), os diários tinham sido apressadamente metidos, com outros pertences pessoais do chanceler, num dos últimos aviões que conseguiram sair da capital germânica. O objectivo era fazê-los chegar a Berchtesgaden, nos Alpes Bávaros - onde Hitler mandara edificar o seu refúgio particular -, colocando-os aí a bom recato.

As coisas, todavia, não correram como havia sido planeado. O avião acabou por despenhar-se nas proximidades de Dresden, tendo sobrevivido apenas um dos passageiros. Acorrera então um agricultor local, que conseguiu salvar parte da carga, incluindo os diários de Hitler - nada mais nada menos do que 62 volumes encadernados em couro artificial preto.
Esta preciosidade tinha ficado escondida durante anos, até chegar às mãos do actual proprietário - o irmão de Kujau.


Gerd Heidemann exibe também um dos volumes dos diários


Gerd Heidemann tomou como boa a história do seu interlocutor. E não mais descansou até conseguir convencer os seus patrões da Stern de que valia a pena um considerável esforço financeiro para obterem e publicarem os ambicionados diários.

Foi assim que 9,3 milhões de marcos mudaram repentinamente de mãos. Depois, no dia 25 de Abril de 1983, a capa da Stern surgiu com uma manchete explosiva: tinham sido finalmente descobertos os diários secretos do ditador alemão!

No interior da publicação, mais de 40 páginas de extractos constituíam o prato forte de um artigo em que se anunciavam, para os próximos 18 meses, mais 27 publicações sobre o mesmo tema.

A revista não tinha dúvidas de que, face ao caudal e à natureza da informação assim alcançada, a biografia do ditador nazi teria de ser forçosamente reescrita. Com isso, a história da Alemanha nazi adquiriria novos e inesperados contornos.


Hugh Trevor-Roper (esquerda) e Gerhard Weinberg (direita)

Na conferência de imprensa efectuada nesse dia na sede da revista, em Hamburgo, Gerd Heidemann pôde ufanar-se do seu feito. E Peter Koch, o editor-chefe, dissertou largamente sobre o triunfo da Stern. Revelou, entre outros pormenores, que, sem que alguém suspeitasse, Adolf Hitler tinha escrito diligentemente os seus diários à mão, desde 1932 até umas poucas semanas antes do suicídio no "bunker".

Em matéria de tal melindre, a Stern procurou acautelar-se com algumas opiniões de peso. E obteve-as da parte de Hugh Trevor-Roper, historiador britânico, e de Gerhard Weinberg, americano da Universidade da Carolina do Norte. Após uma consulta breve dos volumes em causa, ambos afirmaram que os consideravam genuínos.

As cautelas eram mais do que justificadas, face ao interesse que o assunto logo despertou por toda a parte, designadamente entre alguns prestigiados representantes da imprensa mundial.

Por exemplo, o Sunday Times, de Londres, pagou o equivalente a 400 000 dólares pelos direitos de publicação na Grã-Bretanha e na Commonwealth. A Paris Match, de França, e a Panorama, de Itália, dispuseram-se a publicar os diários.

A americana Newsweek apresentou um artigo extenso sobre a matéria, embora tenha hesitado em adquirir os direitos de publicação. Entre outras razões, porque achava indispensável uma autenticação mais segura dos volumes em causa.


Algumas das folhas apresentadas

As dúvidas sobre a autenticidade dos diários tinham sido suscitadas logo no momento da sua apresentação. O controverso historiador David Irving fez uma pergunta embaraçosa, querendo saber se fora efectuada uma análise química da tinta dos documentos para tentar datá-la. Na verdade, não fora.

Para desconforto da Stern, começaram a acumular-se as dúvidas. Como é que Hitler conseguira ocultar de todos os seus próximos, ao longo de 13 anos, que andava a escrever um diário? Por outro lado, sabia-se que ele não gostava de escrever, optando por ditar os seus textos a dactilógrafas. Nas raras ocasiões em que escrevia, utilizava preferentemente o lápis. Acresce que, a partir de certa altura, padecia de violentas tremuras nas mãos, o que o teria com certeza impedido de produzir manuscritos tão cuidados.

Perante o coro crescente de dúvidas e desconfianças, Trevor-Roper e Gerhard Weinberg começaram a vacilar nas suas opiniões. O primeiro chegou a dizer que o melhor era considerar que os documentos eram forjados "até prova em contrário". Weinberg, por seu turno, sugeriu à Stern que recorresse a grafólogos e que permitisse aos historiadores um exame integral dos 62 volumes dos diários.

O escândalo começou a ganhar enormes proporções. Um grafólogo americano, contratado pela Newsweek, analisou em Nova Iorque dois dos volumes e concluiu estar-se perante falsificações - ainda por cima "más falsificações".

Na Alemanha, exames técnicos rigorosos provaram que o papel e a tinta dos diários, a cola das encadernações, as capas de couro artificial e as fitas vermelhas com selos de lacre de alguns volumes datavam inequivocamente de um período posterior à 2.ª Guerra Mundial.

Foi mesmo possível demonstrar que o autor da falsificação seguira fielmente, nos seus textos, uma obra de Max Domarus - Hitler: Discursos e Proclamações, 1932-1945. Até os erros de Domarus se achavam transpostos para os famosos diários.

Já não restava qualquer dúvida: a Stern caíra numa burla fantástica e o seu prestígio ficaria abalado durante décadas. Os seus empregados, indignados com o caso, fizeram uma greve de zelo. Peter Koch pediu a demissão. Gerd Heidemann acabou despedido. E Henri Nannen, editor, proclamou: "temos razão para nos envergonharmos".


Kujau com a famosa capa da Stern. À direita, os livros de Max Domarus que lhe serviram de guião para os diários.

As investigações posteriores conduziram rapidamente ao laborioso falsificador - o exótico Konrad Kujau. Ele confessou tudo, procurando - e conseguindo - implicar Gerd Heidemann no golpe. O repórter defendeu-se dizendo que tinha sido ludibriado, mas a verdade é que se havia locupletado, a título de comissão, com um milhão e meio de marcos (do total de 9,3 milhões pagos pela Stern).

Em 1985, após um mediático julgamento que se arrastou por dois anos, foram ambos considerados culpados de fraude. Kujau foi condenado a quatro anos e seis meses de prisão. Heidemann sofreu uma pena um pouco superior (mais dois meses de prisão).

Quando recuperou a liberdade, Kujau dedicou-se ao que melhor sabia fazer: falsificações. Mas, desta vez, procurou não infringir a lei. Passou a reproduzir e a vender quadros de pintores famosos, como Van Gogh, Rembrandt e Monet, entre outros. Assinava cada um dos quadros de duas maneiras: com a sua firma pessoal e com a do artista original. A sua obra  tornou-se tão famosa que - ironia suprema - começaram a surgir no mercado "falsificações das suas próprias falsificações".

Faleceu no ano de 2000.

Quanto a Gerd Heidemann, continuou incansavelmente a reafirmar a sua inocência.



Recentemente  (15 de Setembro de 2018) a Stern organizou uma exposição, na sua sede em Hamburgo, com sete dos 62 falsos diários de Hitler. Foram igualmente mostrados alguns objectos relacionados com o escândalo, como o ferro de engomar que Kujau utilizou para "envelhecer" o papel.

O chefe de redacção da revista, Christian Krug, afirmou: "estamos a expor a nossa maior ferida". O vice-chefe, Thomas Ammann, disse que o caso dos diários hitlerianos foi "a mãe de todas as fake news".

Alguns diários, anteriormente doados pela Stern a museus e instituições científicas, já tinham sido expostos ao público. Mas esta foi a primeira vez em que a própria revista o fez. Krug adiantou que os exemplares ainda na posse da Stern serão doravante expostos em eventos especiais.