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domingo, 28 de agosto de 2022

Brasil Antigo - Como os portugueses aprenderam a "beber fumo" com os índios...

 



Uma das plantas que mais chamaram a atenção dos portugueses, recém-chegados ao Brasil, foi aquela que denominaram erva-santa, também conhecida por fumo, pétum e petigma.
Era o tabaco.

Alguns jesuítas, como o padre Fernão Cardim (1549-1625), deixaram notas interessantes sobre o novo e estranho vegetal. Referiram, com espanto, o hábito de "beber fumo" que os índios gostosamente patenteavam a partir da combustão das suas folhas.

Diz, entre outras coisas, Cardim:
Costumam estes gentios beber fumo de petigma, ou erva-santa.

Esclarecia que os índios secavam a planta e que a introduziam num canudo feito de folha de palma:

e pondo-lhe o fogo numa ponta metem a outra na boca, e assim estão chupando e bebendo aquele fumo, e o têm por grande mimo e regalo; e deitados em suas redes gastam em tomar estas fumaças parte dos dias e das noites.
A alguns faz muito mal, e os atordoa e embebeda; a outros faz bem e lhes faz deitar muitas reimas [catarro; expectoração] pela boca.




O hábito de "beber fumo" viria posteriormente a ser criticado por alguns padres. Todavia, naquela altura, os eventuais malefícios da planta eram fartamente compensados pelos benefícios que ela, alegadamente, proporcionava.

Acrescenta ainda Cardim sobre o fumo:

As mulheres também o bebem, mas são as velhas e enfermas, porque ele é muito medicinal, principalmente para os doentes de asma, cabeça ou estômago.

Não tardou muito até que os portugueses seguissem, nisto como noutras coisas, o exemplo dos índios:

e daqui - informa Cardim com um laivo de censura  - vem grande parte de os portugueses beberem este fumo, e o têm por vício, ou por preguiça, e imitando os índios gastam nisso dias e noites.

Muitos dos primeiros colonizadores do Brasil tornaram-se fumadores inveterados.
Um dos mais famosos foi o donatário da capitania sulista do Espírito Santo, o infeliz Vasco Fernandes Coutinho, fidalgo português que acabou, pobre e desvalido, a sua aventura brasileira, envolto nas fumaças esbranquiçadas e melancólicas do vício recém-adquirido...


Bibliografia:
Fernão Cardim - Tratados da Terra e Gente do Brasil.

sábado, 14 de maio de 2022

"Você, Brasil" (Jorge Barbosa - Cabo Verde)

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Mindelo - Cabo Verde
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Eu gosto de Você, Brasil,
porque Você é parecido com a minha terra.
Eu bem sei que você é um mundão
e que a minha terra são
dez ilhas perdidas no Atlântico,
sem nenhuma importância no mapa.

Eu já ouvi falar de suas cidades:
a maravilha do Rio de Janeiro,
São Paulo dinâmico,
Pernambuco,
Bahia de Todos-os-Santos.
Ao passo que as daqui
não passam de três pequenas cidades.

Eu sei tudo isso perfeitamente bem,
mas Você é parecido com a minha terra.

É o seu povo que se parece com o meu,
que todos eles vieram de escravos
com cruzamento depois de lusitanos e estrangeiros.
É o seu falar português
que se parece com o nosso falar,
ambos cheios de um sotaque vagaroso,
de sílabas pisadas na ponta da língua,
de alongamentos timbrados nos lábios
e de expressões terníssimas
e desconcertantes.

É a alma da nossa gente humilde que reflecte
a alma da sua gente humilde,
ambas cristãs e supersticiosas,
sentindo ainda saudades antigas
dos sertões africanos,
compreendendo uma poesia natural,
que ninguém lhes disse,
e sabendo uma filosofia sem erudição,
que ninguém lhes ensinou.

O gosto dos seus sambas, Brasil,
das suas batucadas,
dos seus cateretês,
das suas toadas de negros,
caiu também no gosto da gente de cá,
que os canta
e dança
e sente,
com o mesmo entusiasmo
e com o mesmo desalinho também...
As nossas mornas,
as nossas polcas,
os nossos cantares,
fazem lembrar as suas músicas,
com igual simplicidade
e igual emoção.

Você, Brasil,
é parecido com a minha terra,
as secas do Ceará
são as nossas estiagens,
com a mesma intensidade de dramas e renúncias.
Mas há uma diferença no entanto:
é que os seus retirantes
têm léguas sem conta para fugir dos flagelos,
ao passo que aqui
nem chega a haver os que fogem
porque seria para se afogarem no mar...

Nós também temos a nossa cachaça,
o grog de cana
que é bebida rija.
Temos também os nossos tocadores de violão
e sem eles não haveria bailes de jeito.
Conhecem na perfeição todos os tons
e causam sucesso nas serenatas,
feitas de propósito para despertar as moças
que ficam na cama a dormir
nas noites de lua cheia.
Temos também o nosso café da ilha do Fogo
que é pena ser pouco,
mas — Você não fica zangado? —
é melhor do que o seu.

Eu gosto de Você, Brasil.
Você é parecido com a minha terra.

O que é - é que lá tudo é à grande
e tudo aqui é em ponto mais pequeno...
Eu desejava fazer-lhe uma visita
mas isso é coisa impossível.
Queria ver de perto as coisas espantosas
que todos nos contam de Você,
assistir aos sambas nos morros,
estar nessas cidadezinhas do interior
que Ribeiro Couto descobriu num dia de muita ternura,
queria deixar-me arrastar na onda da Praça Onze
na terça-feira de Carnaval.

Eu gostava de ver de perto o luar do sertão,
de apertar a cintura de uma cabocla — Você deixa? —
e rolar com ela um maxixe requebrado.
Eu gostava enfim de o conhecer de mais perto
e você veria como sou um bom camarada.
Havia então de botar uma fala
ao poeta Manuel Bandeira
de fazer uma consulta ao Dr. Jorge de Lima
para ver como é que a poesia receitava
este meu fígado tropical bastante cansado.

Havia de falar como Você
Com um no si
— “si faz favor”—
de trocar sempre os pronomes
para antes dos verbos
— “mi dá um cigarro?”.

Mas tudo isso são coisas impossíveis
— Você sabe? -
impossíveis.


Salvador da Bahia - Brasil.

Jorge Vera-Cruz Barbosa nasceu em 1902 na Ilha de Santiago, Cabo Verde, antiga colónia portuguesa, independente a partir de 1975.

Faleceu na Cova da Piedade, Portugal, em 1971.

Foi funcionário público e um dos membros mais importantes do movimento Claridade.

Publicou:
Arquipélago. São Vicente: Cabo Verde, 1936.
Ambiente. Praia: Cabo Verde, 1941.
Caderno de um Ilhéu. Lisboa: 1956.

Grupo: Cordas do Sol (Cabo Verde)
(Comped Joaquim)


terça-feira, 5 de outubro de 2021

Frederick Remington e o Oeste Americano (Os Índios)

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Invocação ao Búfalo














Regresso de Expedição Guerreira
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Sinais de Fumo
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O Batedor - Amigos ou Inimigos?
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Negociando
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Caçadores de Búfalos
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Sinal com Manta
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(Saiba mais sobre Frederick Remington - aqui)

sábado, 15 de maio de 2021

Maria Quitéria de Jesus - Heroína da Independência do Brasil (1792-1853) - [REPOSIÇÃO]

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Maria Quitéria
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Maria Quitéria de Jesus nasceu no dia 27 de Julho de 1792, no sítio Licurizeiro, em São José das Itaporocas (Cachoeira), na Bahia.
 A sua história foi objecto de divergências entre os historiadores, começando logo no tocante à filiação. Mas o mais provável é que tenha sido a primeira filha dos brasileiros Gonçalo Alves de Almeida e Quitéria Maria de Jesus, que morreu quando a filha tinha apenas nove anos.

A criança assumiu o comando da casa e a criação dos dois irmãos mais novos. Preocupado com os filhos, Gonçalo casou-se pela segunda vez, mas a esposa morreu pouco tempo depois. Gonçalo casou-se de novo e teve mais três filhos com esta esposa - que, diga-se de passagem, não via com bons olhos os modos independentes de Maria Quitéria.

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Maria Quitéria com a sua farda especial
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Mulher bonita, altiva e corajosa, Maria Quitéria montava, caçava e manejava armas de fogo. Tornou-se soldado em 1822, quando o Recôncavo Baiano lutava contra os portugueses a favor da consolidação da independência do Brasil.

O historiador Bernardino José de Souza, autor de Heroínas Baianas, explica que, no dia 6 de Setembro daquele ano, o Conselho Interino do Governo da Província se instalou na Vila de Cachoeira, a 80 km da Serra da Agulha, local onde morava a família de Maria Quitéria.
O Conselho defendia o movimento pró-independência da Bahia e visava obter adesões voluntárias para reforçar as suas tropas.

Maria Quitéria mostrou-se interessada em se alistar, mas foi advertida pelo pai de que "mulheres não vão à guerra".
Ela, então, fugiu: ajudada por sua irmã Teresa, cortou os cabelos, vestiu a farda de seu cunhado e tomou emprestado o seu sobrenome, Medeiros.

Ingressou no Regimento de Artilharia, onde permaneceu até ser descoberta, semanas depois.
Foi então transferida para o Batalhão dos Periquitos e à sua farda foi acrescentado um saiote.

D. Pedro I proclama a independência do Brasil
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Maria Quitéria fez-se notada pela destreza no manejo das armas e pela bravura em combate. No recontro da Pituba, em Fevereiro de 1823, atacou uma trincheira inimiga e fez vários prisioneiros.

Em Abril do mesmo ano, na barra do Paraguaçu, ao lado de outras mulheres e com água pelo peito, avançou contra uma barca portuguesa e impediu o desembarque dos adversários.

Em Julho seguinte, quando o Exército Libertador entrou na cidade de Salvador, ela foi saudada e homenageada pela população.

No dia 20 de Agosto foi recebida no Rio de Janeiro pelo próprio imperador D. Pedro I (um português tornado brasileiro), que lhe concedeu a Condecoração de Cavaleiro da Ordem Imperial do Cruzeiro e um soldo de alferes de linha.

Maria Quitéria aproveitou a ocasião para pedir a D. Pedro uma carta solicitando ao pai que a perdoasse.

Estátua de Maria Quitéria (Salvador - Bahia - Brasil)
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A heroína retornou à fazenda Serra da Agulha e, meses depois, casou-se com o lavrador Gabriel Pereira de Brito, com quem teve uma única filha, Luísa Maria da Conceição.

Em 1835, já viúva, mudou-se para Feira de Santana, a fim de intervir no inventário de seu pai. Impaciente com a morosidade da Justiça, partiu para Salvador, onde morou até ao final da vida sobrevivendo unicamente com o soldo de alferes.

Faleceu no dia 21 de Agosto de 1853, com 61 anos.

Existe uma medalha militar e uma comenda na Câmara Municipal de Salvador que levam o seu nome.

Por determinação ministerial, a imagem de Maria Quitéria passou a estar presente em todos os quartéis, estabelecimentos e repartições militares do país.

Por decreto presidencial de 28 de Junho de 1996, ela foi reconhecida como Patrona do Quadro Complementar de Oficiais do Exército Brasileiro.

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(Extraído, com adaptações, de: Memória VivaMulheres Pioneiras)
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Bibliografia: Heroínas Baianas, de Bernardino José de Souza; As heroínas do Brasil, de Consuelo Pondé de Sena; Dicionário das Mulheres do Brasil, organizado por Schuma Schumaher e Érico Vital Brazil; Mulheres Brasileiras, da Galeria da Fundação Osório e Nossas Mulheres, edição especial da revista Cláudia de Abril de 2000 em comemoração dos 500 anos do Brasil.

Hino do Império Brasileiro:

sábado, 20 de março de 2021

Elaine Sanceau - A inglesa que se apaixonou pela história dos Portugueses [REPOSIÇÃO]

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Elaine Sanceau
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Elaine Sanceau nasceu em Croydon (Inglaterra) em 1896 e faleceu em Leça do Balio (Porto, Portugal) a 23 de Dezembro de 1978.
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Tendo feito os seus estudos em Montreux, na Suíça, daí partiu na companhia da família para o Brasil, país onde se manteve até 1931.

Foi aí, em Terras de Vera Cruz, que Elaine Sanceau contactou, pela primeira vez, com a História de Portugal e, muito particularmente, com o período quinhentista que desde logo lhe aguçou o interesse e lhe despertou o espírito de investigação.
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Fixando residência em Portugal - primeiro no Porto e, mais tarde, em Leça do Balio -, logo se lançou na senda da investigação histórica sobre o período que tanto a atraía.



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Em 1939 saía a lume o seu primeiro grande estudo: Indies Adventures. The Amazing Career of Afonso de Albuquerque, que, na tradução portuguesa, tomou o título de Afonso de Albuquerque - O Sonho da Índia.
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Foi a Livraria Civilização (Porto, Portugal) a editora desta primeira obra da historiógrafa, cuja carreira meritoriamente viria a acompanhar de início a final, abrindo ao público de língua portuguesa o contacto com os estudos da notável investigadora.
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Com O Sonho da Índia nascia uma escritora que aliava uma extrema dedicação a uma seriedade e honestidade de métodos de trabalho que lhe não permitiam falsear as verdades, nem mesmo para incensar o seu país de escolha: Portugal.
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À incansável pena de Elaine Sanceau ficamos a dever nada menos do que trinta e oito vultosos estudos, dos quais vinte e oito sobre o século dezasseis.


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Todos os livros de Elaine Sanceau foram primeiramente redigidos na sua língua materna, mas os seus excelentes conhecimentos de português (falado e escrito) tornaram-na uma crítica severa das traduções que as suas obras recebiam dos colaboradores portugueses.
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Nunca escreveu uma palavra, ou uma frase, sobre um monarca, um príncipe, um vice-rei, um marinheiro, um mercador, um soldado ou um capitão sem que um prévio e exaustivo trabalho de investigação, de estudo e de análise se realizasse nos arquivos portugueses - especialmente na Torre do Tombo e no Arquivo Histórico Ultramarino - com a ajuda de dedicados paleógrafos que punham o seu saber e conhecimento das letras quinhentistas e seiscentistas ao serviço da escritora.
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Deste notável labor resultaram obras que aliam uma extrema simplicidade de linguagem a um rigor histórico que as tornam fontes de informação da maior confiança.



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Oficialmente reconhecida como um dos expoentes da historiografia portuguesa, Elaine Sanceau viu os seus méritos galardoados com o "Prémio Camões" pela obra Em Demanda do Preste João, publicada em 1944, e com as condecorações das Ordens de Santiago de Espada (1953) e do Infante D. Henrique (1961).
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Foi também eleita como membro do Instituto de Coimbra, da Academia Internacional da Cultura Portuguesa e do Centro de Estudos Ultramarinos.
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Também o Porto lhe patenteou o seu reconhecimento ao conferir-lhe, em 1968, a Medalha de Ouro da Cidade.



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Torre da História Ibérica associa-se a estas merecidíssimas homenagens, começando por evocar, no texto acima, o que sobre a grande historiógrafa disseram, em Dezembro de 1979, os seus editores da Livraria Civilização (na abertura da obra Mulheres Portuguesas no Ultramar).

Completamos esta homenagem (extensiva à prestigiosa Livraria Civilização, à qual a cultura portuguesa deve grandes serviços) com três breves excertos das obras de Elaine Sanceau:
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"Situado no extremo do continente europeu, voltado à África, ao sul, e ao vasto espaço ocidental, Portugal era uma estreita plataforma debruçada sobre o Atlântico.

Serras cobertas de pinheiros a envolverem vales pedregosos, que, na estação própria, se enchiam das flores douradas do tojo ou roxas das urzes, corriam até às dunas batidas dos ventos, iluminadas pelas cabeças cintilantes dos orvalhos - toda a situação do país o afastava do continente e o empurrava para o mar.

Embalado em tal ambiente, separado do convívio, do lado da fronteira terrestre, por terras selváticas e penedias, não é de estranhar que uma nação se desenvolvesse predestinada para a vida marítima e para chegar até às remotas regiões da Terra.

Era duma raça vigorosa e heterogénea: Fenícios, Celtas e Latinos já haviam fundido o seu sangue antes de Visigodos e Sarracenos terem combatido nestas montanhas, ou os Normandos vagabundos deixarem as suas povoações junto da costa.

De todos esses elementos brotou um povo, de tipo diverso e de temperamento discordante, irrequieto, aventureiro e até, muitas vezes, conflituoso entre si, mas, desde longa data, pronto a fazer frente ao inimigo ou a tomar parte num empreendimento comum.

A sua terra foi uma das primeiras da Europa a completar a unidade interna e as fronteiras permanentes.

Havendo expulsado o último mouro do Algarve, tendo firmado a sua independência com a vitória sobre Castela, os Portugueses estavam preparados e prontos, no fim do século XIV, para iniciarem a sua missão histórica."

Elaine Sanceau - O Caminho da Índia - Livraria Civilização Editora - Porto - Portugal - 1958 - págs. 39-40.

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"D. João II de Portugal não tinha nada de místico contemplativo. Correr atrás de quimeras não era coisa que atraísse esse monarca vivo e maquiavélico. Se enviou emissários para o desconhecido, era porque estava quase certo de que haviam de encontrar coisa substancial ao cabo da viagem.

Os seus exploradores havia tempo que andavam a reunir informes. Os homens que desafiavam os terrores do mar profundo não se deixavam intimidar pela floresta equatorial.
Internaram-se nela e exploraram-na.

Descobriram-se estranhos reinos negros sob aquelas sombras vaporosas, reinos de adoradores de feitiços, mas até nessas profundezas da noite pagã se recolheram indícios de mais alguma coisa para além.

A vinte luas de jornada para o Sol nascente, declaravam os homens encarapinhados de Benim, reinava o grande rei Ogané. Os chefes de Benim encaravam este Ogané com veneração quase religiosa, como um ser muito superior.

Nenhum deles o tinha visto - enviavam-lhe embaixadores quando subiam ao trono, e nada mais. Nem sequer os embaixadores viam Ogané, pois esta augusta personagem estava sempre oculta, por cortinados, aos olhos dos profanos.

Tudo quanto os enviados de Benim viam dele era apenas um pé, patenteado uma vez só, para que eles deliciassem os olhos antes de abalarem.

Nesta mesma feliz ocasião, Ogané entregava aos seus visitantes um elmo luzidio de latão para o seu rei, e uma cruz do mesmo metal para ele trazer ao pescoço.
Sem estas insígnias nenhum rei de Benim podia reinar legitimamente.

Uma viagem de vinte luas para o Oriente queria dizer duzentas e cinquenta léguas mais ou menos, deduziam os Portugueses do que sabiam do progresso indígena através do mato.

D. João II convocou os especialistas e, mandando vir as suas cartas, estudou, com eles, a questão.
O país de Ogané ficava ao sul do Egipto, e Ogané era, certamente, o Preste João!

D. João II resolveu desencantar esta misteriosa e inacessível personagem do seu esplêndido isolamento e trazê-la ao contacto do pequeno reino do Ocidente."

Elaine Sanceau - Em Demanda do Preste João - Livraria Civilização Editora - Porto - Portugal - 1983 - págs. 19-20.


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 (Do achamento do Brasil pelos navios de Pedro Álvares Cabral - Abril de 1500)

"O Sol declinava lá para os lados da floresta distante. Para o sul, levantava-se uma longa cordilheira, negra na escuridão que descia. A noite cobria rapidamente com o seu manto um continente desconhecido e toldava o mar cor de opala, cujas ondas apagavam com seu marulho os ruídos da floresta.

A escuridão estendia-se por milhas sem conta, cobrindo a terra. Das profundezas do mar ondulavam, ora subindo ora descendo, as luzes trémulas de treze navios.

Os mastros e as vergas, cujas velas haviam sido colhidas, balouçavam, negros, ocultando o Cruzeiro do Sul. Nos elevados castelos da proa e da popa apinhavam-se os homens, com olhos sôfregos a interrogarem a noite.

(...) Inesperada ou não, era uma terra encantadora que se revelou no outro dia, ao amanhecer, quando os navios desferraram as velas para se aproximarem da costa.

Todas de verde brilhante, árvores enormes erguiam seus topes para o azul-ferrete do céu; o mar, também azul-ferrete, desfazia-se em ondas translúcidas sobre a fina areia da praia, e o vento, fresco e rescendente, era como uma carícia

A Pêro Vaz de Caminha lembrava-lhe a brisa do Verão no seu Entre Douro e Minho.

A armada lançou ferro na foz dum rio que corria por entre as sombras verdes. Os capitães reuniram-se na nau capitaina e discutiram os seus planos com os pilotos.
Não era esta uma reunião de personalidades banais a que presidia Pedro Álvares Cabral.

Os veteranos da África e do Oriente discutiram acerca desta terra ocidental - ilha ou continente, que podia ela ser?
Suspeitavam que continente.

O comandante achou que devia chamar-se Terra da Vera Cruz, e monte Pascoal seria a montanha elevada e arredondada que se via para além da floresta, por ser na semana da Páscoa que ele a avistara.

Então Nicolau Coelho, o irrequieto pioneiro de muitos desembarques em costas desconhecidas, foi mandado num pequeno barco até à foz do rio.

Junto da praia via-se um grupo de homens - bronzeados e de cabelos pretos e corredios, nus como Adão no Paraíso. Brandindo arcos e flechas, corriam para a beira da água, olhando espantados para o barco que conduzia os estranhos homens brancos."

Elaine Sanceau - Capitães do Brasil - Livraria Civilização Editora - Porto - Portugal - 1975 - págs. 7-10.

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Elaine Sanceau
(1896-1978)