sábado, 4 de julho de 2020

Um drama da Coroa de Aragão na origem da união ibérica (a que só Portugal escapou...) - Séc. XV

Martín, o Humano, rei da Coroa de Aragão
(1356-1410)
Foi pai de Martín, o Jovem, ao qual sobreviveu.


Nesse tempo  (século XV), não havia ainda a grande Espanha dos nossos dias, cujo território se estende a quase toda a Península Ibérica.



Como se vê neste mapa, a Península dividia-se, então, em cinco partes independentes:

a ocidente, virado para o Atlântico, o reino português;

para o interior, no sentido do Mediterrâneo, estavam Castela, Navarra e a Coroa de Aragão;
a sul, o reino, ainda muçulmano, de Granada.

Destas entidades, a Coroa de Aragão era porventura a mais rica e de futuro mais promissor, constituindo um poderoso agregado político, económico e militar.

Compunha-se, na Península Ibérica, do reino de Aragão (propriamente dito) e do reino de Valência, aos quais se somava ainda o principado da Catalunha.

Da união destas três partes resultou um vasto espaço triangular, independente, cravado no flanco oriental de Castela.

Cada uma das partes da Coroa de Aragão dispunha de leis e de cortes próprias, coexistindo numa espécie de confederação encabeçada pela figura do rei.

O rei era, pois, o garante da unidade desta complexa Coroa.

Coroa de Aragão, com as suas possessões mediterrânicas
(áreas arroxeadas)

Mas o que ajudou a fazer a grandeza maior da Coroa de Aragão foi a sua formidável política de expansão mediterrânica (observe as áreas arroxeadas no mapa acima).

Essa política levou os seus exércitos e os seus navios de comércio, nos séculos XIII e XIV, às ilhas Baleares, à Sardenha (Cerdeña), à Sicília e à Grécia (neste último caso com os famosos Almogávares, guerreiros ferozes, cuja aventura militar no Império Bizantino, em princípios do século XIV, levou à constituição dos ducados de Atenas e de Neopatria, que não tardaram a figurar entre os títulos dos reis de Aragão).

(Nota: mais tarde, em 1443, a Coroa estenderia o seu domínio a cerca de metade da Itália, apossando-se do então chamado Reino de Nápoles - cf. mapa).


Almogávares.
Famosos guerreiros mercenários que ajudaram a construir o império aragonês no Mediterrâneo.

Qual foi então o drama que acabaria por conduzir, a prazo, à união quase total da Península Ibérica em favor de Castela?

Foi a morte de Martín, o Jovem, único filho legítimo - e potencial sucessor - de Martín, o Humano, rei de Aragão.

Martín, o Jovem, tinha sido  nomeado rei de uma das parcelas imperiais da Coroa de Aragão (a Sicília).
Faleceu em 25 de Julho de 1409, na Sardenha, com pouco mais de 30 anos de idade, depois de ter vencido os rebeldes sardos na batalha de San Luri (31 de Maio de 1409).
Fora acometido dias antes por febres fortes, originadas, ao que se pensa, pela malária.

Ficou sepultado na catedral de Cagliari, a sul da mesma ilha da Sardenha, ao centro do Mediterrâneo ocidental.


Mausoléu de Martín, o Jovem (Catedral de Cagliari, Sardenha)

A morte de Martín, o Jovem, constituiu uma tragédia para a Coroa de Aragão, porque deixou sem herdeiro directo o seu pai, Martín, o Humano.

Quando este faleceu (31 de Maio de 1410), colocou-se, naturalmente, o gravíssimo problema da sucessão.

Quem deveria ser nomeado rei da Coroa de Aragão?

Surgiram vários candidatos, todos eles aparentados com os antigos reis de Aragão (como o duque de Gandía, o conde de Urgel, o duque de Calabria e, até, um neto bastardo do Humano - o pequeno Frederico, que Martín, o Jovem, tivera de uma jovem siciliana).

Nenhum deles chegaria ao trono aragonês.

Com efeito, após dois anos de interregno, seria escolhido um castelhano para rei (através do chamado Compromisso de Caspe - 28 de Junho de 1412).


Fernando I de Aragão (1380-1416)
Nomeado titular da Coroa de Aragão pelo Compromisso de Caspe.

Esse castelhano, feito rei de Aragão, chamava-se Fernando e era irmão do rei Enrique III de Castela.

Era ainda sobrinho do falecido Martín, o Humano, e neto de Pedro, o Cerimonioso (pai de Martín).

Reinou em Aragão de 1412 a 1416, tendo-lhe sucedido o filho, também nascido em Castela (Alfonso V de Aragão).

Esta entrada em Aragão de uma dinastia castelhana (os Trastâmaras) facilitaria, a prazo (não no imediato), a perda da independência aragonesa (que durava há séculos).

Com efeito, um neto de Fernando (igualmente chamado Fernando e herdeiro da Coroa de Aragão) casaria um dia com a rainha castelhana Isabel, a Católica.
Ficaram desse modo criadas as condições para que, mais tarde, já nos princípios do século XVI, se produzisse a união das duas Coroas (Castela e Aragão).

Com a conquista de Granada aos Muçulmanos (1492) e, alguns anos depois, a anexação de Navarra, ficou constituído o espaço que conhecemos agora com o nome de "Espanha".

Só Portugal ficou de fora desta união de países da Península Ibérica.

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Nota: Entre outros factores, são as lembranças desse passado rico e livre que levam hoje muitos dos descendentes dos antigos senhores de Aragão (com destaque para os Catalães) a sonharem, de novo, com a independência - veja aqui.

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