sexta-feira, 31 de julho de 2020

Requiem (Manuel Alegre)


 
Há mortos que demoram a morrer

é inútil sepultá-los
eles voltam

demoram-se por vezes numa sombra
num braço de cadeira
ou no rebordo partido de uma chávena.

Ou então escondem-se
em pequenas caixas sobre as mesas.

Há objectos que ficam cheios deles
são como o rosto transmudado dos ausentes
sua marca na casa e no efémero.

Por isso custa tanto retirar o prato e o talher
arrumar os fatos
desfazer a cama.

Há mortos que nunca mais se vão embora.
Há mortos que não param de doer.


(Manuel Alegre - Portugal)
.....

Requiem (In Paradisum)
(Gabriel Fauré)

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