1 - As minhas ideias pessoais mantêm-se iguais ao que sempre foram.
A vida é muito dura, muito agreste, brutal, curta de mais, feia e má, e, no fim, não há esperança que nos salve.
A isto chamo eu realismo.
E sei que estou a ser apenas realista.
2 - Claro que, quando a imprensa vem falar comigo, a ideia que transpira é “oh, mas que tipo tão pessimista e cínico!”, mas a sério que não me acho.
Sinto mesmo que a nossa maior obrigação na vida é aceitar o facto de que a vida não quer dizer nada, é vazia, que somos o resultado de um acaso tendo por fundo um universo que também não tem significado nenhum.
Universo esse que, claro, também vai acabar como tudo o resto.
3 - No meio disto tudo, dizem-me, a minha obrigação continua a ser a de viver como se isto não fosse verdade, viver sem negar o que é evidente, como se fosse possível enxotar a coisa para debaixo do tapete.
Sou ainda suposto acreditar que, por cima de tudo, há um deus a proteger-nos, omnipotente.
Ou, pior, que o amor é capaz de salvar tudo, que a arte é eterna, que os artistas têm um lugar especial no céu; ou outro amortecedor qualquer que passamos de uns para outros para aliviar a crueldade dos factos.
É preciso olhar estas realidades nos olhos e, apesar delas, encontrar o nosso caminho.
4 - É por isto que não me vejo como pessimista ou cínico.
Quem me acha pessimista é que vive debaixo de uma enorme ilusão.
Essas pessoas, não as percebo.
Venderam-se a si mesmas uma verdade sobre o significado final da existência, quando toda a gente sabe que, lá para o fim, não há boas novidades para ninguém.
Lá para o fim é tudo muito decepcionante.
Agora, imagine: tenho de levar uma vida de homem decente tendo como moldura estes parâmetros. (…).
5 - Veja o meu caso.
Tenho 73 anos [em 2009]. Isso quer dizer que a qualquer momento posso ficar velho.
Tenho 73 anos [em 2009]. Isso quer dizer que a qualquer momento posso ficar velho.
E enfermo.
E a cair para o lado.
Quer dizer, ainda vou estar sujeito a todas as coisas horrendas que me estão reservadas.
Quer dizer, ainda vou estar sujeito a todas as coisas horrendas que me estão reservadas.
6 - Naturalmente, terei de confirmar que até tive uma vida óptima, no tal contexto cinzento que é a vida humana.
Sei que houve muita gente que levou uma vida impensavelmente cruel.
Mas, no fim, é como naqueles comboios do “Stardust Memories”.
Vão todos dar ao mesmo terminal.
7 - No fim, é isso que acontece ao homem rico, à actriz bonita, ao artista, ao político, ao médico, ao filósofo e ao homem pobre que pedinchava na rua.
Acaba tudo na lixeira.
Eu nunca disse que não tinha tido uma sorte incrível.
Tive.
Nasci nos Estados Unidos, em Nova Iorque, e vivi toda a vida aqui.
Nunca tive problemas graves de saúde, apaixonei-me por mulheres lindas, maravilhosas, que tanto trouxeram de bom para a minha vida. Tenho uns filhos bestiais.
Mas isso não quer dizer que, ao sair deste prédio, não vá ser imediatamente espalmado por um piano caído do último andar. (*)
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(*) - Revista Única, jornal Expresso (Lisboa - Portugal), de 5 de Setembro de 2009.
Entrevista obtida por Rui Henriques Coimbra em Nova Iorque.
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Aceda a uma das surpreendentes manifestações artísticas de Woody Allen.
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