sábado, 15 de fevereiro de 2020

Pêro Vaz de Caminha - Quem era, e como terminou os seus dias, o autor da "certidão de nascimento" do Brasil?


Pêro Vaz de Caminha foi o escrivão, embarcado na frota de Pedro Álvares Cabral, a quem coube relatar, por escrito, em Abril de 1500, os dias extraordinários do descobrimento da terra brasileira pelos Portugueses (reveja aqui).
Por isso mesmo, considera-se que a ele se ficou a dever a "certidão de nascimento" do grande país da América do Sul - que em Portugal se encara e se sente como o "País Irmão".


Pêro Vaz de Caminha nasceu em meados do século XV (talvez em 1450) na cidade do Porto, Norte de Portugal.  Era homem bem integrado na vida pública da urbe natal, tendo ocupado cargos de relevo. Sabe-se, por consulta das respectivas actas, que esteve presente nas reuniões da Câmara entre 1488 e 1498.
Foi, a partir de 1479, mestre da Balança da Moeda do Porto (cargo herdado do pai e em que foi confirmado pelo rei português, D. Manuel I, em 1496).

Comandando as tropas do Porto, participou na batalha de Toro, que os Portugueses travaram em Castela no 1.º dia de Março de 1476.
Pêro Vaz de Caminha foi ainda cavaleiro das Casas Reais de vários monarcas lusitanos (D. Afonso V, D. João II e D. Manuel I).
Foi casado com D. Catarina Vaz, de quem teve uma filha, D. Isabel de Caminha.

Possuía formação literária humanista e conhecia bem os autores latinos, achando-se familiarizado com as obras clássicas. Era, sobretudo, um ser aberto ao mundo, dotado de profunda sensibilidade, como pode ser comprovado pelas maravilhosas e emocionantes descrições que ele fez, na sua famosa "carta", da terra brasileira - fauna, flora, meio físico - e, sobretudo, das suas gentes.



Infelizmente, Pêro Vaz de Caminha não viveria tempo suficiente para testemunhar as repercussões que a sua "carta" - dirigida ao rei D. Manuel I - tivera em Portugal.
Com efeito, e como é do conhecimento geral, o destino final daquela expedição de Pedro Álvares Cabral não era o Brasil, mas sim a Índia. Tratava-se da segunda viagem realizada pelos Portugueses até àquele país asiático, depois da descoberta da respectiva rota por Vasco da Gama (rever aqui).

Discute-se, ainda hoje, se a descoberta da Terra de Vera Cruz (o Brasil) ocorreu por acidente ou por um desvio deliberado da rota principal. As teses mais recentes e sustentadas apontam para a segunda hipótese - e essa é também a nossa opinião: os Portugueses saberiam de antemão que existia por ali uma terra nova, assim se explicando o desvio pronunciado que levaram a cabo para realizar o desembarque.

Fosse como fosse, havia que cumprir o plano originalmente concebido em Lisboa - o objectivo final da viagem era Calecute, na Índia, e foi esse o rumo que retomaram ao cabo de dez dias. A carta de Pêro Vaz de Caminha, com a notícia do "achamento do Brasil", fora entretanto expedida para Lisboa num dos navios da frota que Cabral mandara regressar à pátria.

 

A frota portuguesa navegou, pois, em busca de Calecute, na Índia, onde chegou após uma viagem dramática: Cabral perdeu vários navios na travessia do Atlântico para o Índico; quando ancorou no seu destino, restavam-lhe sete embarcações das treze com que havia deixado Lisboa.
Na Índia, para além das motivações religiosas, os Portugueses estavam sobretudo interessados em participar no comércio local, acedendo às preciosas especiarias para as transportar até à Europa. Com esse intuito negociaram durante meses a fio com o governante local, o Samorim, até que conseguiram obter permissão para fundar um entreposto comercial (uma feitoria), à frente da qual Pedro Álvares Cabral colocou Aires Correia.

Como é natural, os muçulmanos que dominavam até então a actividade comercial na região (os mouros de Meca, como lhes chamavam os Portugueses) não viram com bons olhos a ameaça dos novos concorrentes. Durante algum tempo viveram-se episódios de intrigas e traições. O comportamento do Samorim foi, no mínimo, ambíguo, mas parece ter sido com a sua conivência que uma multidão de muçulmanos enfurecidos atacou o edifício da feitoria portuguesa. O grosso dos expedicionários, incluindo Cabral, achava-se no mar, a bordo da frota, pelo que na feitoria permaneciam, apenas, cerca de 70 homens. Entre eles estavam o feitor, Aires Correia, alguns frades franciscanos e, para mal dos seus pecados, o escrivão Pêro Vaz de Caminha.



Refugiados na feitoria, os Portugueses resistiram enquanto puderam. Mas o número de atacantes era esmagador, pelo que Aires Correia decidiu a retirada até à praia, onde talvez lhes chegasse algum auxílio enviado por Pedro Álvares Cabral. Correndo e lutando, a maioria conseguiu alcançar a beira do mar, mas aí verificaram que as ondas, muito agitadas, impediam a aproximação dos botes de socorro. Cercados pela multidão que os perseguia, envolveram-se então numa derradeira e desesperada luta.

Ainda que bastante feridos, vinte homens lograram atirar-se ao mar, onde, correndo risco de afogamento, foram sendo recolhidos pelos batéis da frota.
Na praia, para os seus companheiros, o drama estava todavia consumado. Aires Correia acabou trucidado, bem como três frades franciscanos e cerca de cinquenta homens. Entre as vítimas do massacre encontrava-se Pêro Vaz de Caminha - o autor da "certidão de nascimento" do Brasil.
Era o dia 15 de Dezembro de 1500, e tinham decorrido menos de oito meses sobre o momento em que ele avistara pela primeira vez, para a descrever de forma emocionada e deslumbrante, a maravilhosa Terra de Vera Cruz...

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