quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Grandes Quadros - Renoir (França)

Madame Clémentine Stora (L'Algérienne)

Renoir - França - (1841-1919)

sábado, 22 de agosto de 2009

Sul de Angola - O Gado Sagrado entre os Nhanecas-Humbes (1)



"O grupo étnico que apelidamos de Nhaneca-Humbe constitui um grande agregado populacional no Sudoeste de Angola. Possui uma unidade étnica bastante bem definida e a sua coesão linguística é facilmente observável para quem se dedica a estudos desta natureza.

Inclui os seguintes povos: Muílas, Gambos, Humbes, Donguenas, Hingas, Cuâncuas, Handas, Quipungos e Quilengues.

Com excepção da região de Quilengues e parte da área da Bibala, podemos dizer que estes povos ocupam a terra planáltica do Sul de Angola.

Esta área atinge o seu ponto mais elevado no planalto do Bimbe, perto da Humpata (cerca de 2300 metros), descaindo gradualmente até ao vale do Cunene.



Não se pode falar na vida pastoril destes povos sem mencionar a existência do gado sagrado (machos ou fêmeas bovinos).

Regra geral, os animais sagrados são herdados ou recebidos como presente do pai, de um tio materno ou de um irmão. Referindo-se a um deles no singular, chamam-lhe otyi-panga, que quer dizer "o animal amigo".

O espírito do benfeitor falecido parece protegê-los ou, mesmo, residir neles. Os espíritos comunicam por seu intermédio com os vivos. São como que a protecção da família: todo o bem que a esta sucede é facilmente atribuído à sua interferência. Por isso se lhes presta culto e se lhes dispensam cuidados muito especiais.


Tudo o que esteja relacionado com estes animais reveste um carácter sagrado - o leite, os excrementos, o vaso da ordenha, o lugar onde o leite é distribuído.

Nunca podem ser alienados e, se forem roubados, constitui tal facto um grande desastre para o dono e para a família deste.

Todo o nhaneca que se respeita deve possuir pelo menos dois bois (ou vacas) sagrados: um recebido do pai e o outro herdado do tio materno. Os mais ricos têm quatro ou cinco.

 

É entre os Nhanecas que se encontram talvez mais variedades de animais sagrados. Conhecem eles pelo menos seis classes de "bois" sagrados:

1 - Onaluhonge, que quer dizer: "aquele da vara". - Pode ser um macho que o filho recebe de seu pai. Trata-se, porém, geralmente, de uma vitela. Assim que tiver a primeira cria, o leite só poderá ser utilizado pelo proprietário ou pelos companheiros de circuncisão. Os mesmos, e só eles, podem comer a carne desta vaca, quando ela morrer de doença ou de velhice.

2 - Ondyila-ombe - É uma vaca oferecida ao filho do falecido dono do gado. O leite pertence exclusivamente ao órfão e a seus filhos, se os tiver. Enquanto pequenos, alimentar-se-ão do leite desta vaca; uma vez crescidos, abster-se-ão de o fazer, por respeito.

De vez em quando conduzem todas as vacas ao cemitério - todas, mesmo as profanas. Vão acompanhadas dos seus vitelos, a um dos quais se racha então uma orelha ao meio. O sangue, derramado sobre as campas, é oferecido como sacrifício aos mortos aí enterrados. Se o vitelo vingar e for fêmea, ficará automaticamente sagrado como otyi-panga. Um animal destes não pode ser alienado.

3 - Onumatwa, "a mordida", por causa da orelha fendida. Esta vaca pouco difere da precedente. Para a consagrar, porém, não é necessário ir fazer a cerimónia ao cemitério. O animal foi recebido por um sobrinho, por ocasião da morte de um tio: é como o seu memorial. O leite pertence ao dono e aos seus filhos. A descendência desta vaca pode no entanto ser vendida.




4 - Onamphinga, "a do herdeiro". - É um boi geralmente abatido por ocasião da morte do dono. Os herdeiros só podem comer da carne do peito, que é imediatamente separada do resto, logo depois de a rês ter sido abatida. A esta carne especial têm também direito os parentes próximos paternos.

5 - Ondilisa, "faz chorar", por alusão aos prantos fúnebres. É o boi morto por ocasião do passamento do proprietário. Mas não se lhe come a carne, a qual é lançada aos cães. O couro pertence aos herdeiros.

6 - Onamulilo, "o do fogo". Temos aqui um boi macho muito respeitado e ao qual se não podem dar maus tratos. O dono, depois de o ter escolhido, manda um dia ministrar-lhe umas drogas por um quimbanda, o que o torna imune aos ataques do leão. Com efeito, declarou-me um velho da região da Quihita: Como poderá ele ser atacado pelo leão, se tem fogo no seu corpo?!
Quando morrer, unicamente mulheres e raparigas lhe podem comer a carne." (*)

(*) - Adaptado de: Padre Carlos Estermann - Etnografia do Sudoeste de Angola - Vol. 2 - Grupo Étnico Nhaneca-Humbe - Junta de Investigações do Ultramar - Lisboa - Portugal - 1960.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Aberturas de Grandes Livros - "A Cartuxa de Parma" (Stendhal - França)

 
“A 15 de Maio de 1796, o general Bonaparte entrou em Milão à frente daquele juvenil exército que acabava de passar a ponte de Lodi e mostrara ao mundo que, passados tantos séculos, César e Alexandre tinham um sucessor.
Os milagres de audácia e de génio que a Itália presenciou no decorrer de alguns meses acordaram um povo adormecido; oito dias antes da chegada dos Franceses, os Milaneses ainda não viam neles senão um punhado de salteadores, habituados a fugir diante das tropas de Sua Majestade Imperial e Real; era, pelo menos, o que, três vezes por semana, lhes repetia um jornalzinho do tamanho da palma da mão, impresso em papel sujo.


Na Idade Média, os Milaneses eram valentes como os Franceses da Revolução, e mereceram ver a sua cidade completamente arrasada pelos imperadores da Alemanha. Desde que se tinham tornado fiéis súbditos, a sua principal preocupação consistia em imprimir sonetos sobre lencinhos de tafetá cor-de-rosa, quando se casava alguma menina pertencente a família nobre ou rica. Dois ou três anos após essa grande época da sua vida, a menina tomava um cavaleiro andante: o nome do chichisbéu escolhido pela família do marido ocupava por vezes um lugar honroso no contrato de casamento..

Ia grande distância desses costumes efeminados às profundas emoções a que deu lugar a chegada imprevista do exército francês. Em breve surgiram novos e apaixonados costumes. Um povo inteiro deu conta, a 15 de Maio de 1796, de que tudo quanto respeitara até então era supremamente ridículo e por vezes odioso. A partida do último regimento austríaco marcou a queda das ideias antigas: arriscar a vida passou a ser moda (…)”. (*)

A Cartuxa de Parma - Stendhal (1783-1842) - Publicado em 1967 por Editorial Estúdios Cor - Lisboa - Portugal.

Disponível na Biblioteca Nacional de Lisboa - (Cota --> L. 18864 V. )

sábado, 15 de agosto de 2009

Os Dias da Indignidade - Escravatura


"(...) O que despontava era um negócio de amplitude colossal, suportado por uma cúpi­da associação de cumplicidades, in­cluindo as de um sem-número de potentados negros, no Congo e fora dele.
Estes líderes, e os seus agentes, promoviam incur­sões bélicas aos territórios vizinhos.


A troco dos prisioneiros que assim obtinham, recebiam das mãos dos negreiros as cobi­çadas armas de fogo, bebidas alcoólicas e bugigangas supérfluas que faziam a sua efémera grandeza.
Neste negócio em progressão, a contagem das peças passou, ao correr dos anos, das centenas aos milhares, dos milhares às centenas de milha­res - e destas aos milhões.


Desmoronavam-se os seculares sistemas produtivos, em especial os que se funda­vam na agricultura.
A África tocada pelos Europeus esvaía-se por acção de guer­ras sem quartel, num cenário de pilhagens e destrui­ções que deslocavam popula­ções inteiras, aterrorizadas pelos caçadores de gente. (...)


(...) Pelas trilhas do sertão africano, galgando destinos de agonia e indignidade de­baixo do silvo do chicote e das injúrias dos guardas, intermináveis colunas de ca­tivos negros dirigem-se a marchas forçadas para os locais de embarque no litoral.
Extenuados e trôpegos, seguem manietados e ligados uns aos outros. Muitos osten­tam os pescoços cingidos por gargalheiras de ferro ou por ramos de árvore bifur­cados. Os retardatários são executados sem contemplações.
Os mais robustos progridem esmagados por fardos de mercadorias ou por grandes pedre­gulhos e sacos de areia com que se suprime neles, de maneira expedita, toda a veleidade de fuga.

 
Chegados à costa, depois de ultrapassada uma rede de numero­sos interme­diários, homens, mulheres e crianças são encafuados em barracões insalubres. Aqui se amontoam dias a fio, aguardando a sinistra aparição, no hori­zonte, do ve­lame dos navios negreiros que vêm para os arrebatar à sua pátria.

 
Os compradores são meticulosos e eficazes.
Investigam-lhes os membros, os dentes, os seios, os testículos, as nádegas, os olhos, a própria expressão. Volteiam-nos. Palpam-nos. Avaliam-nos.
Quando satisfeitos, marcam-nos de modo indelével com ferros em brasa.


Transidos de pânico e dor, são então guiados para porões escuros, quase desprovidos de ventilação, onde ficam acorrentados em tabuados imundos.
Nas travessias do Atlântico, rumo às Américas, gasta-se, em condições infernais, de um a dois meses.

Segundo registos fidedignos, o espaço de cada um dos prisionei­ros raramente excede o de um morto no seu ataúde. Viajam com frequência encai­xados uns nos outros como colheres.

Durante as tempestades, jogados pelo balan­ço dos navios, revolvem-se apavorados, aos gritos, na pasta fétida dos dejectos e do vomitado dos enjoos.

A devastação das epidemias é me­donha e, por vezes, ocorrem suicídios. Os cadáveres são logo atirados pela borda fora. Por tudo isto se qualificam de tumbeiros esses navios lúgubres, que fazem lembrar gigantescas tumbas flutuantes. Levam muitas vezes no seu rasto de espuma alvacenta uma fiei­ra de barbatanas de tubarões impelidos pelo instinto.


Desembarcados nas Américas, os sobreviventes são tratados a preceito. En­gordam-nos, besuntam-nos com óleo, às vezes espevitam-nos com drogas. É for­çoso que evidenciem um aspecto aceitável no instante da venda.
Seguem depois ao seu destino, vergados à dor e à saudade da terra-mãe e das famílias perdidas.


Somem-se de vez no emaranhado das plantações ou no negrume das minas, cum­prindo fados sombrios e desprovidos de esperança. Entoam dolentes cânticos de mágoa - segundo o costume da sua terra, como anotara, muitos anos antes, num irreprimível impulso de compaixão, o cronista Zurara." (*)

(*) - José Bento Duarte - Senhores do Sol e do Vento (Crónicas Verídicas de Portugueses, Angolanos e Outros Africanos) - Editorial Estampa - Lisboa - Portugal - 1999.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

sábado, 8 de agosto de 2009

A Grande Música Portuguesa - Suite Alentejana n.º 1 (Luís de Freitas Branco)

 
Podem ouvir aqui:



 
Luís de Freitas Branco nasceu em Lisboa, em 12 de Outubro de 1890, e faleceu na mesma cidade em 27 de Novembro de 1955.
Compositor musical, domina o século XX português com a estatura de um colosso, de importância comparável, no domínio da música, a um Fernando Pessoa.
Poderosa e multiforme, a sua criação colocou Portugal em sintonia com a Europa, em certos casos antecipando-se a ela.
Veio estabelecer um novo patamar de excelência, tornando-se pedra de toque do reportório português em praticamente todos os domínios.

Educado no meio familiar, cedo tomou contacto com a música, aprendendo violino e piano.
Aos 14 anos compõe canções que atingem grande popularidade.
Aos 17 inicia a crítica musical no Diário Ilustrado.
Estuda também órgão.

Em 1910
viaja até Berlim para estudar composição, música antiga e metodologia da história da música.
Em Maio de 1911 vai até Paris, onde conhece Claude Debussy e a estética do Impressionismo.
Em 1915 participa nas Conferências da Liga Naval sobre a Questão Ibérica promovidas pelo Integralismo Lusitano.
Em 1916 é nomeado professor no Conservatório de Lisboa, sendo seu subdirector entre 1919 e 1924. Desenvolveu actividade em diversos domínios da vida cultural.
Manteve estreitas relações com diversas figuras, como Alberto Monsaraz, António Sardinha, Hipólito Raposo, Bento de Jesus Caraça e António Sérgio.

A partir de 1940 a sua figura era acusada de irreverente por se comportar de maneira imprópria nas aulas, sendo constituído arguido num processo do qual resultaria a suspensão como docente no Conservatório.
(Extracto do seu Diário, em 27 de Outubro de 1931:
A cena que se passou no Conservatório é grave e sintomática: dois agentes da polícia quiseram levar preso o candidato a concurso para a cadeira de Piano Fernando Lopes Graça.
A prisão era motivada por inscrições nas paredes da cidade de Tomar de que Fernando Lopes Graça teria sido autor e instigador, e que significavam pouco amor à Ditadura.
O júri protestou, impôs-se à polícia, o candidato prestou as suas provas, seguiu preso para Santarém e ficou classificado em primeiro lugar com 18 valores.
E em 1 de Novembro:
O meu discípulo Fernando Graça continua preso e está à mercê de gente que tem do valor dele a mesma noção que a minha égua Picarça pode ter do valor de Shakespeare.)

Realiza então palestras na Emissora Nacional e mantém tertúlias com um grupo de discípulos.
Era irmão do maestro português Pedro de Freitas Branco.
Está sepultado no cemitério dos Prazeres, em Lisboa.

Joly Braga Santos, seu discípulo, escreveu sobre ele:
Ao significado da sua obra notabilíssima, da sua personalidade fecunda e dominadora, há a juntar a verdadeira paixão que possuía pela Juventude, o entusiasmo com que via os novos triunfar, a sua luta diária, durante cinquenta anos, pelo renovamento, pela europeização da cultura portuguesa, e ainda a generosidade do seu grande coração, sempre disposto a ajudar os que começavam e vivendo com o mesmo entusiasmo as obras dos próprios discípulos, que pretendia sempre colocar à frente das suas.

Obras principais:

Sinfonia n.º 1 (1924)
Sinfonia n.º 2 (1926)
Sinfonia n.º 3 (1944)
Sinfonia n.º 4 (1952)
Scherzo Fantastique (1907)
Antero de Quental - poema sinfónico (1908)
Paraísos Artificiais - poema sinfónico (1910)
Tentações de S. Frei Gil (1911)
Vathek (1913)
Violin Concerto (1916)
Suite Alentejana n.º 1 (1919)
Suite Alentejana n.º 2 (1927)
Solemnia Verba - poema sinfónico (1951)

(Adaptado de Wikipédia) (Foto alentejana: João Matos)

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Milagre da Vida...

 
(Foto: NickGr)