segunda-feira, 26 de abril de 2021

Portugal - "Uns vão bem e outros mal" (Fausto Bordalo Dias)

 



A canção abaixo - Uns vão bem e outros mal - pertence ao álbum Madrugada dos Trapeiros, que Fausto Bordalo Dias lançou em 1977. Tinham passado somente três anos sobre a revolução de 25 de Abril, que pusera termo à ditadura em Portugal, e os sentimentos e ardores revolucionários palpitavam ainda nos versos deste baile mandado.

Nos dias que correm, quase meio século consumido sobre a data revolucionária, alguns dos queixumes parecem infelizmente actuais. Na pátria lusa e não só. Em muitas e diversas paragens - tal como cá, no torrãozinho à beira-mar plantado -, há uns poucos que vão singrando cada vez melhor, sobranceiramente intocáveis no topo ofensivo de seus lucros, luxos e fortunas. Ao passo que outros, porventura a imensa maioria - precisamente aqueles de quem se extraíram, sem escrúpulos nem piedade, tais lucros, luxos e fortunas -, continuam a sobreviver aos tombos, sempre na iminência do naufrágio, prosseguindo vidas cinzentas, miseráveis e já sem esperança...



Senhoras e meus senhores,
façam roda por favor
Senhoras e meus senhores,
façam roda por favor,
cada um com o seu par
Aqui não há desamores,
se é tudo trabalhador,
o baile vai começar.

Senhoras e meus senhores,
batam certos os pezinhos,
como bate este tambor
Não queremos cá opressores,
se estivermos bem juntinhos,
vai-se embora o mandador
 Vai-se embora o mandador

Faz lá como tu quiseres,
faz lá como tu quiseres,
faz lá como tu quiseres
Folha seca cai ao chão,
folha seca cai ao chão

Eu não quero o que tu queres,
eu não quero o que tu queres,
eu não quero o que tu queres,
Que eu sou doutra condição,
que eu sou doutra condição

De velhas casas vazias,
palácios abandonados,
os pobres fizeram lares
Mas agora todos os dias,
os polícias bem armados
desocupam os andares
Para que servem essas casas,
a não ser para o senhorio
viver da especulação

Quem governa faz tábua rasa,
mas lamenta com fastio
a crise da habitação

E assim se faz Portugal,
uns vão bem e outros mal.

Faz lá como tu quiseres,
faz lá como tu quiseres, 
faz lá como tu quiseres
Folha seca cai ao chão,
folha seca cai ao chão

Eu não quero o que tu queres,
eu não quero o que tu queres,
eu não quero o que tu queres,
Que eu sou doutra condição,
que eu sou doutra condição

Tanta gente sem trabalho,
não tem pão nem tem sardinha
e nem tem onde morar
Do frio faz agasalho,
que a gente está tão magrinha
da fome que anda a rapar

O governo dá solução,
manda os pobres emigrar,
e os emigrantes que regressaram
Mas com tanto desemprego,
os ricos podem voltar
porque nunca trabalharam

E assim se faz Portugal,
uns vão bem e outros mal.

Faz lá como tu quiseres,
faz lá como tu quiseres,
faz lá como tu quiseres
Folha seca cai ao chão,
folha seca cai ao chão

Eu não quero o que tu queres,
eu não quero o que tu queres,
eu não quero o que tu queres,
Que eu sou doutra condição,
que eu sou doutra condição.

E como pode outro alguém,
tendo interesses tão diferentes,
governar trabalhadores
Se aquele que vive bem,
vivendo dos seus serventes,
tem diferentes valores.

Não nos venham com cantigas,
não cantamos para esquecer,
nós cantamos para lembrar
Que só muda esta vida,
quando tiver o poder
o que vive a trabalhar

Segura bem o teu par,
que o baile vai terminar.

Faz lá como tu quiseres,
faz lá como tu quiseres, 
faz lá como tu quiseres
Folha seca cai ao chão,
folha seca cai ao chão.

Eu não quero o que tu queres,
eu não quero o que tu queres,
eu não quero o que tu queres,
Que eu sou doutra condição,
que eu sou doutra condição.

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