sábado, 16 de maio de 2020

Portugal também foi vítima da destruição da "Invencível" Armada Espanhola (1588)

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Filipe II de Espanha (Filipe I de Portugal)
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Em 1588, Filipe II (1527-1598) era rei de Espanha, de Nápoles, da Sicília e dos Países Baixos. E, também, de Portugal, país que a Espanha dominou no período compreendido entre 1580 e 1640, como consequência do desastre militar lusitano em Alcácer Quibir, Norte de África, em 1578 (rever aqui).

Nesse ano de 1588, Filipe II estava à beira de tornar o seu reino no maior império de que havia memória. Tinha do seu lado um poder absoluto, uma ideologia de pendor universal (o catolicismo militante da época, com propósitos de expansão da fé contra a heresia protestante), um exército e marinha temíveis e aliados poderosos como a Santa Liga e o Papa Sisto V.


Isabel I de Inglaterra
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Como pretextos de acção imediata, Filipe II invocava os ataques dos corsários ingleses aos seus navios e portos e o suplício da rainha católica Maria Stuart, da Escócia, que fora mandada executar por sua prima, a rainha Isabel I da Inglaterra (1533-1603).

No caminho dos Espanhóis atravessava-se precisamente essa Inglaterra de Isabel I, a grande campeã herética contra o mundo católico e uma gravíssima ameaça, devido ao desenvolvimento do seu comércio e aos ataques constantes às possessões ultramarinas da Espanha e de Portugal.

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Grandes forças terrestres, sob o comando do general espanhol Alexandre Farnésio, duque de Parma, preparavam-se nos Países Baixos para invadir a Inglaterra. Para isso, era indispensável eliminar o domínio inglês no canal da Mancha.

Com esse objectivo, Filipe II encarregou o seu mais famoso almirante, Álvaro de Bazán, marquês de Santa Cruz, de organizar uma armada capaz de derrotar a inglesa. O marquês começou os preparativos, mas morreu em Fevereiro de 1588, pelo que o rei de Espanha tratou de nomear novo almirante, desta vez Alonso Pérez de Guzmán, duque de Medina Sidónia.

Em carta ao rei, o duque de Medina Sidónia alertou para a sua completa ignorância das coisas do mar e para a sua inexperiência em assuntos de guerra. Mas o projecto foi avante.

Assim se reuniram no rio Tejo, em Lisboa (Portugal), cerca de 200 velas e um exército de 20 000 homens – a mais grandiosa esquadra da Idade Moderna, considerada “invencível” pelo rei espanhol, e que, por tal motivo, ficaria conhecida nas páginas de história pela designação de La Grande y Felicísima Armada, ou Armada Invencible ou, ainda, Armada Española.

Eram portugueses muitos dos navios, tal como parte considerável das tripulações.

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A tracejado: rota da Invencível Armada, com partida de Lisboa (canto inferior esquerdo).

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A 9 de Maio de 1588, a Invencível largou de Belém (Lisboa), mas só conseguiu ultrapassar a barra no dia 28. A 19 de Junho arribava à Corunha (Galiza, Norte de Espanha), apresentando-se dispersa, com água aberta nalguns navios, provisões apodrecidas e infestada de doenças.

Novas cartas então dirigidas a Filipe II só tiveram como resposta a ordem de apressar a partida, que ocorreu a 21 de Julho. A Invencível chegou à costa sudoeste de Inglaterra no dia 29.

As instruções de Filipe II chamavam a atenção para a superioridade dos navios ingleses - mais aperfeiçoados em casco e armação e dotados de muito maior velocidade de marcha e manobra; dispunham ainda de mais peças de artilharia e de superior alcance de tiro. Por isso, dizia o rei, eles deveriam ser atacados por barlavento e a curta distância.

Como é que isso se poderia fazer é que ele não explicava.
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De 29 de Julho a 6 de Agosto de 1588, a Armada Invencible seguiu de perto a costa inglesa (ver mapa). Embora revelasse uma precisão de manobra impressionante, para além de elevada disciplina na sua formação em crescente, não conseguiu forçar os Ingleses a uma batalha generalizada, nem, muito menos, obrigá-los ao combate próximo ou a manobras de abordagem.

Os Ingleses, verificando que não conseguiam dispersar a temível formação em crescente, passaram a fustigá-la de longe, e quase impunemente, com a sua artilharia. Com isso forçaram os navios inimigos, nas suas tentativas de resposta, a gastar inutilmente a maioria das 123 790 balas de canhão com que tinham sido abastecidos.
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No dia 6 de Agosto, a Invencible estava às portas do perigoso mar do Norte. Com inadiável necessidade de se reabastecer, fundeou em frente do porto de Calais. O ânimo das tripulações era péssimo e o optimismo inicial desaparecera por completo.

Nessa mesma noite, os Ingleses lançaram um ataque com navios incendiários, o que fez dispersar a Armada pela primeira vez.
A perseguição que logo se seguiu, e à qual os navios da Invencible mal podiam ripostar, causou as primeiras perdas sensíveis.

No dia 8 de Agosto os navios lograram voltar à formação, mas, apesar dos sacrifícios heróicos de alguns deles para forçarem abordagens com os inimigos, só lhes restaram duas alternativas: ou a fuga ou o aniquilamento total.
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Uma mudança de vento providencial ainda salvou a Invencible dos baixios de Dunquerque.
Medina Sidónia deu então ordem para que os navios regressassem a Espanha, contornando a Escócia e a Irlanda (cf. mapa).

Foi uma viagem de pesadelo, em que a sede, a fome, o esgotamento, as doenças, o mau estado dos navios e violentas tempestades desfalcaram brutalmente a Armada.
Mesmo assim, ainda se salvaram alguns navios (há divergências sobre o seu número, havendo autores que apontam para 53 embarcações regressadas a Espanha, ou seja, cerca de um quarto do efectivo inicial).

Isabel I de Inglaterra recebe as suas tropas em Tilbury

Convém rectificar algumas lendas e inexactidões espalhadas desde então, especialmente no tocante à alegada inépcia do duque de Medina Sidónia, comandante da Invencible. Hoje, já se lhe vai fazendo justiça e não terá sido ele o maior culpado do desastre.

Face às instruções que levava e às circunstâncias com que deparou, poucas decisões suas representam erros incontestáveis.
Em quase todas as situações mostrou-se modesto, sensato, corajoso, empenhado numa tarefa provavelmente irrealizável com os meios de que dispunha. Erros semelhantes aos seus foram cometidos pelas chefias inglesas, só que estas tiveram por si a vitória.
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Filipe II de Espanha, ajoelhado, recebe a notícia do desastre de La Invencible Armada

Consumado o desastre espanhol e o triunfo inglês, ambas as partes invocaram, à sua maneira, a intervenção divina.
Os católicos espanhóis lamentaram-se: “Não foram os homens que nos venceram, foi Deus!”.
Os protestantes ingleses, por sua vez, vangloriaram-se: A nossa causa é justa, Deus está connosco!

De qualquer modo, a ambição de Filipe II saldou-se num rude golpe para o seu prestígio, ao passo que a Inglaterra viu aumentar a sua importância como potência marítima, abrindo-se-lhe mares antes vedados e podendo atacar de futuro, com diferentes perspectivas de êxito, os domínios ultramarinos espanhóis e portugueses.

No tocante a Portugal, faltando ainda 52 anos para recuperar a sua independência, o que aconteceu constituiu um gravíssimo desaire.

De facto, como se disse, muitos dos navios da Invencible eram portugueses, como o eram também centenas de marinheiros e soldados.

O País sofreu as consequências de uma catástrofe que não tinha provocado, e, com a continuidade do domínio da Espanha, foi vítima de cobiçosos ataques ao seu império colonial por parte dos inimigos desta, com realce para os Holandeses (sobretudo na Ásia, em Angola e no Brasil, onde chegaram a instalar-se e de onde foi difícil expulsá-los).
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Adaptado de:
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Rodrigo Machado – Armada Invencível – Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura – Vol. 2 - Editorial Verbo – Lisboa – Portugal.
Joaquim Veríssimo Serrão – Armada Invencível – Dicionário de História de Portugal – Vol. 1 – Livraria Figueirinhas – Porto – Portugal.
Antonio Ballesteros Beretta – Sintesis de Historia de España – Salvat Editores – Barcelona-Madrid – Espanha – 1952.

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