Odette Sansom |
Odette Sansom, uma
dona de casa francesa e mãe de três filhas, resolveu tornar-se espia dos
Aliados na Segunda Guerra Mundial. Foi capturada e torturada, mas sobreviveu sem
nunca quebrar.
A sua história acaba de ser publicada em Portugal. “Nome de código Lise”,
editado este mês pela Vogais, é a história verdadeira de uma espia do SOE
(Executivo de Operações Especiais), que poderia ser banal, não fosse o caso de
esta mulher pouco conhecida ser a mais condecorada de todos os espiões da
Segunda Guerra Mundial.
Odette Sansom
Hallowes, também conhecida como Odette Churchill, era uma mulher “bastante
vulgar, talvez até enfadonha”, que não bebia, não fumava, nem praguejava. Não
obstante, era uma "assassina treinada”, uma heroína da resistência francesa, que
foi presa, torturada e levada para um campo de concentração, sem nunca ter
“quebrado”, conta o autor, Larry Loftis, no prefácio do livro.
Como refere o escritor
num artigo publicado pela revista “Time”, “peça-se a um aficionado da Segunda
Guerra Mundial que nomeie os espiões mais condecorados da guerra e
provavelmente recebe-se uma de três respostas: Dusko Popov (nome de código:
Tricycle), o agente duplo que avisou o FBI sobre Pearl Harbor e que inspirou o
James Bond de Ian Fleming; Juan Pujol (nome de código: Garbo), o espanhol que
enganou os alemães com uma falsa rede de 15 agentes; ou Roman Garby-Czerniawski
(nome de código: Brutus), o agente duplo polaco que tinha cem agentes na rede
de espionagem que criou, a Interallié.
À esquerda o espião sérvio Dusko Popov (Tricycle). À direita, a ficha consular brasileira do espião espanhol Juan Pujol (Garbo).
Afirma o autor: Todos
eles foram grandes espiões e determinantes para enganar os alemães quanto ao
dia D, todos eles foram condecorados, mas as suas condecorações empalidecem
quando comparadas com as de uma espia chamada Odette Sansom (nome de código:
Lise), distinguida com a Ordem do Império Britânico, a Ordem Nacional da Legião
de Honra (a maior condecoração francesa), a Cruz de George (a mais alta
condecoração civil do Reino Unido), e mais outras cinco medalhas”.
O mesmo se passou com
o próprio autor do livro, que, até “descobrir” Lise, estava convencido de que
Dusko Popov fora o maior espião da Segunda Guerra Mundial, e talvez o maior
espião da história.
Foi ocasionalmente,
quando lia “História do Coronel Henri”, as memórias do sargento Hugo Bleicher,
agente secreto alemão que trabalhava contra a Resistência Francesa na França
ocupada pelos nazis, que esbarrou com Odette Sansom. Hugo Bleicher infiltrara-se numa rede em que estava
implicada uma espia dos Aliados chamada ‘Lise’”, descreve o autor no prefácio
do livro.
Foi então que ele mergulhou em tudo o que tivesse sido publicado em inglês sobre o assunto, a começar
pelas fontes primárias, desde biografias a memórias de várias personalidades que com ela privaram ou
se cruzaram. Analisou ainda todos os documentos do SOE que lhe fizessem referência e viu as
entrevistas pessoais de Odette em 1986.
Depois de toda a
informação que recolheu, questionou-se “como era possível que quase ninguém
tivesse conhecimento daquela mulher” e decidiu contar a sua história.
Odette Sansom |
Em 1942, não se
vislumbrava um fim para a Segunda Guerra Mundial e Odette Sansom, casada com um
inglês e mãe de três meninas, decidiu seguir o exemplo do pai na Primeira
Guerra Mundial e tornou-se agente do SOE, como mensageira, para ajudar a
Grã-Bretanha e a França.
Após cinco tentativas
falhadas e um acidente de avião, Odette desembarca por fim na França ocupada para dar início à sua missão e é então que conhece o seu oficial superior, o
capitão Peter Churhill, líder do circuito.
À medida que completam
com êxito missão atrás de missão, Peter e Odette apaixonam-se, mas cada sucesso
aproxima os inimigos da sua localização, até que são traídos por outro agente.
Os dois foram detidos
por Hugo Bleicher e enviados para a prisão em Paris, sendo posteriormente
interrogados. Mas enquanto Peter Churchill seguiu o protocolo do SOE e se fez de “tonto” - negando tudo, exceto ser um agente britânico -, Odette fez o oposto e
disse aos alemães que ela era a líder da rede e que Peter era apenas um peão na
operação.
Odette foi então
entregue à Gestapo, sendo interrogada 14 vezes. Sujeita à fome e à tortura, “nunca quebrou”, e a sua resposta era sempre a mesma: “Não tenho nada a dizer”.
Prisioneiras no campo alemão de Ravensbrück. |
Quando a Gestapo
percebeu que ela nunca falaria, condenou-a à morte e enviou-a para o local mais
temido por todas as mulheres na Europa, Ravensbrück,
um campo de concentração feminino a cerca de 90 quilómetros de Berlim. Ali foi colocada numa prisão subterrânea, conhecida como “o Bunker” (rever aqui e aqui).
Durante três meses e
oito dias definhou numa pequena cela, ora demasiado quente, ora gelada,
praticamente sem comida e em escuridão total, exceto durante cinco minutos por
dia em que se acendia uma luz por cima da sua cabeça.
O corpo não tardou a
ficar coberto de chagas, sofreu de disenteria e escorbuto, perdeu o cabelo e
dentes, e acabou por sucumbir a um estado de semi-coma, mas o médico da
enfermaria reanimou-a com uma injeção e ela voltou para a cela. Aguentou até ao
fim sem nunca entregar o nome de nenhum agente.
Odette sobreviveu à
guerra quase milagrosamente, ao contrário de muitos dos seus camaradas do SOE. Até ao fim da vida, pediu para que ninguém os esquecesse.
Em algumas entrevistas
que deu, admitiu não haver outra razão para ter sobrevivido senão o nome
Churchill. Apesar de não haver qualquer parentesco entre Peter
Churchill e Winston Churchill (primeiro-ministro do Reino Unido durante a
guerra), existia a convicção deste parentesco, que ela nunca desmentiu.
Odette separou-se de
Peter ao fim de nove anos de casamento (em 1956) e casou-se com Geoffrey
Hallowes. Morreu em 1995, com 82 anos.
Em 1950 foi feito um
filme sobre ela, “Odette”, que se estreou na altura com grande aclamação em
Inglaterra e nos Estados Unidos (ver cartaz a seguir).
(Fonte do texto: Redacção da TVI24 - Lisboa - Portugal - 27-Junho-2019)
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