domingo, 7 de junho de 2009

O Drama de Juana - Irmã de Inês de Castro


Da história de Inês de Castro, assassinada, a mando de um monarca português, numa manhã fria de Janeiro (1355), se tratou já. A imagem mítica da sua tumba sumptuosa, em Alcobaça, permanece nítida na memória de muitos.
"O túmulo de Inês de Castro assenta sobre os dorsos dos responsáveis da sua morte. São várias criaturas enigmáticas, displicentemente agachadas, três de cada lado da arca. Meio-homens, meio-bichos, meio-presos, meio-livres. Reparem neles com vagar. Voltados para fora e, à primeira vista, tranquilos, parecem espiar despreocupadamente quem passa. Como se estivessem apenas curiosos do movimento, debruçados de uma varanda inocente (...). Espreitam, de expressões alheadas, com ares de quem ignora porque os condenaram a suportar tal peso" (*).


Longe de Alcobaça, umas centenas de quilómetros para norte, na catedral de Santiago de Compostela (Galiza, Espanha) descansam os restos de uma outra Castro - Juana, também galega, irmã da Inês martirizada em Portugal.
O seu destino - ainda que menos sangrento do que o da irmã - foi, também, dramático.
Juana cruzou um dia o seu destino com o terrível Pedro I de Castela (El Cruel), de quem falámos a seu tempo.
Soberana por uma noite - porque logo repudiada pelo monarca - intitulou-se rainha durante o resto da sua vida.
Até acabar no túmulo de Santiago de Compostela - maciço, frio e severo, nada comparável aos rendilhados lendários que servem de última morada à irmã.
A história conta-se em palavras breves.

(Túmulo de Juana de Castro, irmã de Inês, na catedral de Santiago de Compostela, Galicia - España)
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"(...) Dizem que o reizinho se indispôs, nestes começos da Primavera de 1354, com a sua amada Maria de Padilla. Não obstante tratar-se, apenas, de arrufos de namo­rados - tão efémeros e estimulantes como sempre são as zangas dos apaixonados sinceros -, sucede que Pedro, por birra ou por fortuita guinada do instinto, desvia nesta altura o sentido para uma tentadora viuvinha galega, dispondo-se a corte­já-la.

A bela furta-se aos avanços do monarca e faz-lhe graciosamente saber que, com ela, intimidades só por casamento. O reizinho, picado com tão esquiva formosura, morde o anzol e promete logo que sim, que casará. O problema, torna a viuvinha, é que o rei já é casado com a francesa de Bourbon. Pedro não é pessoa para se embaraçar com ninharias destas. Blanche não constitui, para já, em­pecilho de monta, pois ele mantém-na fora de circulação, detida em Arévalo." (*)

 
"Quanto ao resto - isto é, no que respeita às trapalhadas da legalidade -, o rei con­voca de urgência dois homens de autoridade e fé, os bispos Sancho de Ávila e Juan de Salamanca, e com eles arruma o caso em três tempos. Pergunta-lhes Pedro: o que têm os senhores bispos a opinar sobre o malfadado casamento com Blanche de Bourbon em Santa Maria la Nueva?

Os bispos, fartos de saber do que a casa gasta, logo certificam, com um frio na espinha, que não há que falar aqui em casamento: é mais do que óbvio que o enlace de Valladolid não valeu, foi nulo, é como se nunca tivesse existido.
El-rei que se considere, pois, o mais livre dos homens e que se case com quem lhe apetecer.

Convencida pelas respostas destes varões sapien­tes, a viuvinha diz um sim enternecido ao rei e logo se unem os dois em Cuéllar.
O casamento durará, apenas, a noite de núpcias, o que, mesmo lembrados os ante­cedentes do noivo, é coisa de espantar." (*)

 
"Que foi que sucedeu?
No mesmo dia das bodas, chegaram a Pedro notícias da rebelião que ganha vulto nas cercanias de Badajoz. Fornecem-lhe pormenores e nomes: Albuquerque, Enrique, Fadrique, os Castros.
Os Castros?
Pedro indigna-se, fica numa fúria e, no dia seguinte, parte de Cuéllar a toda a pressa, sem mais querer saber da nova esposa.
Jamais se tornarão a ver, e o reizinho não tardará a serenar nos braços quentes e únicos de Maria de Padilla, que daqui a pouco o presenteará com Constanza, a segunda filha.
Para bem se compreender mais esta reviravolta conjugal, desvende-se, enfim, a identidade da es­posa repudiada: Juana de Castro, irmã de Fernando e Álvar de Castro, e também, naturalmente, daquela sedutora Inês que vive e ama em terras lusitanas." (*)


"Os Castros, sabedores da partida que o rei Pedro pregou à sua Juana, põem-se a remoer vinganças e adquirem outro balanço para a rebelião.
Na Galiza, Fernando faz questão de comparecer, dias a fio, diante de um notário, para que publicamente se ateste a sua ruptura com o rei de Castela. Dentro de pouco tempo, à testa de sete­centos e trinta cavaleiros e de mil e duzentos peões, ele partirá ao encontro das forças dos bastardos e de João Afonso de Albuquerque para com elas formar o exército da rebeli­ão.
Álvar de Castro é por seu turno incumbido de uma missão delicada: a de atrair o herdeiro do trono português à causa dos rebeldes castelhanos (...)". (*)

(*) José Bento Duarte - Peregrinos da Eternidade - Crónicas Ibéricas Medievais - Editorial Estampa - Lisboa - 2003.

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